domingo, 9 de maio de 2010

Expectativas da política na pós-modernidade: o pensamento de Slavoj Zizek

A contemporaneidade está permeada de discussões sobre o futuro das sociedades e as mutações que essas vêm sofrendos nos frenéticos processos de queda e incorporação de determinados valores. O filósofo esloveno Slavoj Zizek traz um pouco da lógica dessas mutações, estabelecendo como marco inicial o neoliberalismo1, o qual representa, segundo Zizek, uma contrar-revolução que elimina a relação sinônima entre capitalismo e democracia representativa2. Contudo, tal contrarrevolução termina com o advento da chamada ''hipótese comunista'', que resurge na contemporaneidade dentro do também emergente populismo. Segundo Zizek:

''Tratar o comunismo como Idéia eterna implica que a situação que o gera não é menos eterna, e que o antagonismo ao qual o comunismo reage sempre estará presente. E a partir daí estaremos a um passo apenas de uma análise desconstrutiva do comunismo como um sonho de presença, um sonho que se alimenta da sua própria impossibilidade.'' (ZIZEK, 2009)

Contudo, a ascenção de movimentos radicais coexiste ironicamente com um declínio do interesse nas questões políticas e sociais, no que se refere às sociedades tradicionalmente radicais que hoje pautam suas discussões em temas quase descritos por Zizek como sendo irrelevantes.
O filme ''Avatar'' e o ataque mal sucedido ao capitalismo

Entrando na temática do desvio de ideologia da crítica contemporânea, Slavoj Zizek afirma que o filme Avatar, de James Cameron, traz, na verdade, um olhar holística e não é adequado à discussão que retrata a luta de classe, como escreve a crítica.

Segundo Zizek, a visão do capitalismo ''opressor e destruidor da natureza'',enfatizado no filme na figura das multinacionais, vai contra o princípio de que ''a natureza é um produto cultural que muda com a mudança das relções sociais'' pois a continuidade de nossa espécie depende do que retiramos da natureza.

Há no texto uma ideia do capitalismo como inimigo do mundo. Zizek acredita que o retrocesso do pensamento, numa tentativa de retomar uma ''idade do ouro'', não é a maneira de derrotar o inimigo que é capitalismo.

O populismo no capitalismo contemporâneo

Zizek diz que ''o povo como natureza é uma invenção'', assim como a carranca do inimigo capitalista é uma criação da contemporaneidade para exprimir a necessidade de superação de suas próprias falências.

O filósofo também afirma que o argumento da barreira de impedimento de um povo usa da figura do ''inimigo'' para disseminar práticas populistas de discriminação social, tendo como exemplo máximo o antissemitismo na Alemanha nazista e atualmente os diversos – e às vezes negligenciados – movimentos contra migrantes, principalmente na Europa.

A ideologia liberal e o populismo

A retirada da hipótese comunista da discussão pública auxilia na ascenção do populismo na realidade contemporânea. Zizek abre um parêntese para explicitar as diferenças entre comunismo e socialismo real3 e define pontos de contato entre a ideologia liberal e o populismo, trazendo seus pontos igualitários – quando ambos pressupõem o estilo de vida ocidental capitalista como único possível – e distanciadores das duas vertentes – os liberais impõem suas questões, inclusive com uso de poder bélico, enquanto os populistas pregam políticas étnicas mais brandas.
A democracia pós-constitucional

A noção de democracia é refeita por Zizek dentro da ideia da eliminação da tradicional entre os três poderes: o executivo, legislativo e judiciário. A pós-democracia, emergente na Itália sob a representação quase icônica de Sílvio Belusconi, evidencia uma tentativa de conjugação entre democracia liberal e populismo. Sem que haja exclusão dos direitos civis e políticos dos cidadãos, a supremacia do executivo se utilizaria da participação popular – ou voto – para vigiar ou regular a si próprio.

Zizek traz o exemplo do encontro realizado no ano passado em Copenhague, Dinamarca, sugerindo que as propostas derrotadas, as quais ''salvariam'' o meio ambiente, marcam uma tentativa de salvar o capitalismo do declínio.

A volta do ideal comunista

A colisão entre força produtiva e relações sociais de produção. Zizek diy que tal choque é o legado deixado por Lenin, tornando-se eterno à medida em que existe insatisfação e submissão entre os setores da força-trabalho de determinada sociedade. Ao definir a ideia comunista como ''eterna'', Zikek diz se referir ''ao fato de que é uma constante na história humana a tensão de superar a condição de escravidão e exploração''.

Os abismos criados pelo capitalismo, no que se refere às diferenças sociais, é um agente promotor desse descontetamento nas sociedades que adotam tal sistema.

A fala de Slavoj Zizek tensiona nossa percepção aos limites do sistema capitalista e de forma as inquietudes provocadas por ele nos guiam ao ressurgimento do ideal comunista. Contudo, concordar com o ideário da comuna, pregador da sociedade igualitária, é também esquecer que nenhma forma de governo estará livre do controle de um ''superior'', mesmo que este seja apenas uma referência representativa de determinada sociedade. 

Ao decorrer de nossa história pudemos perceber como os regimes autoritários emergem a partir do que acreditamos ser justo e igualitário. Hoje acompanhamos as tensões sociais na China e nos questionamos acerca da falta de liberdade des eu povo. Traçar ideiais que englobam toda uma sociede é, antes de tudo, não esquecer da capacidade extrema de mutação de nosso pensamento e de nossos conceitos do que é ou não liberdade, poder, política e governo. Zizek nos deixa a ideia de que olhar para a contemporaneidade, portanto, é olhar para a renovação de um ciclo.

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REFERÊNCIAS


CIEPAC, Centro de Investigaciones Económicas y Políticas de Acción Comunitaria. ¿Qué es el neoliberalismo? Disponível em <http://www.ciepac.org/neoliberal/esp/neoliberalismo.html> Acesso em 27 abr. 2010.


ROMM, Dave. The Difference Between Socialism and Communism: the cognitive dissonance created by Lenin and Reagan. Disponível em: <http://www.romm.org/soc_com.html> Acesso em: 26 abr. 2010.


SLAVOJ ZIZEK. As razões do pensamento crítico. Entrevista com Slavoj Zizek. Itália: Il Manifesto, 13/04/2010. Entrevista concedida a Benedetto Vecchi. Tradução por Anete Amorim Pezzini. Disponível em <http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&ltemid=18&task=detalhe&id=31755>


_______________. A Hipótese Comunista: Começar do Começo. São Paulo: Revista Piauí nº 34, Julho 2009. Disponível em: <http://barrettoacioly.arteblog.com.br/186683/A-HIPOTESE-COMUNISTA-COMECAR-DO-COMECO/> Acesso em 27 abr. 2010.


WIKIPEDIA: A Enciclopédia Livre. Democracia Representativa. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Democracia_representativa> Acesso em 27 abr. 2010. 




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